CARTAS POMBALINAS| Pombal e o rescaldo das Eleições Presidenciais

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Com todas as condicionantes derivadas da crise sanitária que atravessamos, Marcelo Rebelo de Sousa foi reeleito Presidente da República, tendo contado com 12377 votos em Pombal, um pouco abaixo dos 15593 votos que obteve em 2016.
Quanto à participação eleitoral, votaram nestas Presidenciais 19203 pessoas no concelho de Pombal, o que equivale a uma abstenção de 61,04%, em linha com os 60,05%, a que correspondeu a abstenção a nível nacional.

Os resultados revelam algo que já tínhamos noção, que a esmagadora maioria do eleitorado conservador e moderado do nosso concelho voltou a dar uma vantagem muito confortável a Marcelo Rebelo de Sousa e que André Ventura capitalizou o voto dos descontentes com o sistema, dos descrentes na evolução da nossa “jovem” democracia e dos que têm outra perspectiva sobre os valores e princípios constitucionais em que assenta o nosso Estado de Direito.
Vitorino Silva alcança um surpreendente quarto lugar à frente de Marisa Matias que esteve muito apagada em toda a campanha, de João Ferreira que, para mim, era o candidato mais consistente do espectro eleitoral e de Tiago Mayan que era o candidato menos conhecido do grande público.
Ana Gomes, em Pombal, ficou no terceiro lugar, com apenas 1656 votos, a quatro pontos percentuais de AV, o que revela a consistente desmobilização da área socialista onde residia o seu eleitorado expectável, recordando (e ressalvando as diferenças de circunstância) que Sampaio da Nóvoa, há 5 anos, alcançou quase 3000 votos em Pombal.

1. A grave situação pandémica e as Presidenciais;
Antes das eleições, partilhei a minha opinião no sentido de defender que face à gravidade da crise sanitária que estamos a atravessar, estas eleições deveriam ter sido realizadas noutra altura. Para além de todos os riscos de saúde pública associados, neste acto eleitoral, milhares de cidadãos que se encontravam em isolamento profilático não puderam exercer o seu direito cívico o que não considero justo.
Não tendo sido possível adiar as eleições, não posso deixar de destacar o enorme exemplo dado por todos aqueles que contribuíram para que este acto eleitoral pudesse decorrer em segurança e deixar uma mensagem de reconhecimento à nossa população que participou neste acto eleitoral e que assim contribuiu para valorizar a democracia.

2. A campanha eleitoral e as funções do Presidente da República;
Nesta campanha, lamentavelmente, não se falou das funções presidenciais, nomeadamente, nos debates, onde se esgrimiram argumentos pessoais, referências ideológicas, assuntos da actualidade mas, na generalidade dos casos, não se discutiu o que estava verdadeiramente em causa que era a eleição do Presidente da República e o exercício da sua magistratura de influência no uso das competências que lhe são conferidas pela Constituição, à luz do nosso sistema semipresidencialista.

3. Marcelo, o todo-poderoso e a política dos afectos e de proximidade;
Marcelo Rebelo de Sousa rompeu com o normal exercício das funções de Presidente da República, exercendo o seu mandato numa relação de (muito) maior proximidade com os portugueses e valorizando a componente humana do exercício de funções públicas, estimulando uma relação de afectos com as pessoas com quem foi contactando.
Pode gostar-se mais ou menos do estilo, mas a verdade é que mais de dois milhões e meio de portugueses disseram, nas urnas, que se reviam na forma como o Presidente da República tem desempenhado as suas funções, tendo uma aceitação social muitíssimo elevada.

4. O eclipse da esquerda e a estratégia de Costa (o moderado);
O Bloco de Esquerda e o PCP assumiram que o resultado a nível nacional (e aqui no nosso burgo) foi negativo, tendo ficado muito aquém das suas expectativas. O PS também não fica bem na fotografia. Ana Gomes (que falhou o objectivo da segunda volta e quase ia ficando em terceiro lugar), acusou António Costa da deserção do PS e Pedro Nuno Santos quis usar estas eleições como rampa de lançamento na sucessão de António Costa. As divisões (veja-se a intervenção dura de Manuel Alegre) ficaram expostas e avizinham-se capítulos interessantes na luta interna pelo poder no seio do PS.
Ainda assim, considero que a estratégia de António Costa (a nível pessoal) até pode ter saído vencedora, já que foi o primeiro a lançar Marcelo naquela sua “tirada” na Autoeuropa, dando-lhe o seu apoio pessoal e fazendo com o que o PS não tivesse um candidato declarado. Está escrito nas estrelas que uma das ambições de Costa pode passar por suceder a Marcelo daqui a cinco anos e a estratégia passa por distanciar-se da extrema-esquerda, ir colando o PSD à extrema-direita e “reinar” no eleitorado do centro que, normalmente, faz a diferença nas eleições. Vamos ver as cenas dos próximos capítulos.

5. A tendência de diminuição do número de votantes e de eleitores;
Algo que deve merecer a nossa preocupação e o nosso empenho prende-se como facto de termos tido, em Pombal, nas Presidenciais de 2016 cerca de 22974 votantes num total de 53730 inscritos e que, neste ano de 2021, termos 19203 votantes num universo de apenas 49286 inscritos. Recordamos que nas Presidenciais de 2011 contámos com 23356 votantes e tínhamos 55501 eleitores.
Ou seja, em apenas uma década, em eleições Presidenciais, temos menos 4153 votantes e menos 6215 eleitores. Uma tendência que urge ser contrariada com uma estratégia integrada de mobilização de todas as forças políticas e dos sectores mais dinâmicos da nossa comunidade.

6. O combate à abstenção e a digitalização do processo eleitoral;
Estes dados da abstenção continuam a ser muito preocupantes e urge fazer uma reflexão profunda sobre a forma de voltar a aproximar os cidadãos das eleições, reforçando a formação cívica e a cidadania.
Estas Presidenciais, no meio de uma crise sanitária, ainda alertaram mais para a necessidade de imprimir a urgente modernização do sistema eleitoral português.
O voto electrónico tem que ser uma realidade no nosso país e é preciso ter a coragem e a determinação de implementar este sistema, porque tenho a certeza que, para além dos ganhos processuais e ambientais, também dará um contributo importante para aumentar a participação eleitoral da nossa população.

Um forte abraço amigo,
Pedro Pimpão
pedropimpao@gmail.com

 

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Pedro Pimpão é natural de Pombal, tem 36 anos, é casado e tem dois filhos. É advogado de profissão e actualmente desempenha as funções de deputado à Assembleia da República, tendo sido eleito pelo círculo eleitoral de Leiria. É Presidente da Assembleia de Freguesia de Pombal, membro da Assembleia Municipal de Pombal e membro da Assembleia Intermunicipal da Região de Leiria. É licenciado em Direito pela Universidade Coimbra, contando com Pós-Graduações em Direito Administrativo, Gestão Autárquica, Direito dos Contratos Públicos e Direito Municipal Comparado Lusófono. É Mestrando em Ciência Política pelo ISCSP – Universidade de Lisboa.