Inês António e o desafio de fazer da restauração uma escolha

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Inês António, natural de São Simão de Litém, representa uma geração que quer fazer da restauração não um sacrifício, mas uma escolha. Aos 26 anos, é chefe de sala num conhecido restaurante na Costa de Lavos.

Inês António fotografada na sala principal do Xiringuito onde sobressai a ampla janela com vista para o mar

O sol de Outono filtrava-se pelas amplas vidraças, aquecendo a sala enquanto o rumor das conversas e o tilintar dos talheres embalavam a paisagem. Apesar de a hora do almoço já ter praticamente terminado, o Xiringuito, na Costa de Lavos, ainda respirava o ritmo frenético de uma casa cheia, mesmo num dia de semana. É neste ambiente de conforto e naturalidade – desenhado numa arquitectura que privilegia o areal e o mar e pontuado pela decoração em madeira – que encontrámos Inês António.
Aos 26 anos, Inês é chefe de sala do Xiringuito, um restaurante que se tornou referência no concelho da Figueira da Foz desde a sua abertura, em 2022. Chegou um ano depois, em 2023, e encontrou ali um espaço em crescimento, liderado na cozinha pelo namorado, com quem partilha o percurso profissional desde os tempos de estágio.
“Comecei por tirar o curso de Técnico de Restaurante/Bar, em Fátima, na Escola de Hotelaria”, conta. Foi ali que começou a descobrir o gosto pelo contacto com as pessoas, pela arte de servir e pela rotina intensa que define o quotidiano. A escola deu-lhe as primeiras oportunidades: estágios no Algarve, primeiro em Albufeira, depois em Tavira e, mais tarde, em Vilamoura. Experiências que consolidaram o gosto pela profissão, mesmo quando o mundo parou com a chegada da pandemia.
Nessa altura, “voltei para cima, para a Figueira, porque o meu namorado é daqui”, recorda. A mudança trouxe também um novo rumo: Trabalhou no restaurante Praça 18, até que, em 2023, ingressou na equipa do Xiringuito, aberto um ano antes. “Comecei com o serviço de mesa normal e depois passei a responsável de sala”, diz com simplicidade, como quem não dá por garantido o mérito do próprio esforço.

“É preciso ter muita resiliência e gostar mesmo do que se faz. Gostar de lidar com as pessoas, com os clientes”

A profissão que escolheu exige muito: horários longos, ritmos intensos, trabalho em dias em que os outros descansam. Ainda assim, Inês fala da carreira que abraçou com serenidade. “É preciso ter muita resiliência e gostar mesmo do que se faz. Gostar de lidar com as pessoas, com os clientes.” No Xiringuito, a rotina segue o compasso das estações: no Verão, das 11 da manhã às 10 da noite; no Inverno, o ritmo abranda, e o restaurante fecha ao fim da tarde. A jornada de trabalho começa às 11h00 e termina às 18h00, excepto à sexta e ao sábado, únicos dias em que há jantares.
“Trabalhar em frente ao mar é uma mais-valia. Às vezes chegamos cansados, mas basta olhar o mar e tudo acalma.”
E o Xiringuito é um lugar que parece feito para respirar esse equilíbrio. A arquitectura aposta na madeira e na luz natural, com uma sala principal, onde se destaca uma ampla janela com vista para o mar, e duas esplanadas — uma coberta e outra descoberta (no patamar inferior) — desenhadas para que quem ali se senta nunca perca o horizonte. Na esplanada descoberta, encaixada nos blocos do edifício, que ao mesmo tempo a protegem em dias mais ventosos, as crianças podem brincar na areia enquanto os pais almoçam tranquilos. “É um restaurante muito virado para famílias”, explica Inês. “As pessoas gostam de vir aqui porque se sentem à vontade.”

“Trabalhar em frente ao mar é uma mais-valia. Às vezes chegamos cansados, mas basta olhar o mar e tudo acalma”

 

Os eleitos de um menu dominado pelo peixe
Na cozinha, o menu combina tradição e modernidade, sempre com o mar como inspiração. Os pratos mais procurados falam dessa ligação: os estaladiços de tamboril com arroz de berbigão são o ex-líbris da casa, mas neste cardápio de eleição entram também a feijoada de búzios e, claro, o peixe grelhado, vindo directamente da lota. “Trabalhamos sempre com peixe fresco.” Aliás, a profunda ligação ao mar não é fruto do acaso: a patroa, Rita, é natural da Cova da Gala e filha de um pescador.
Nas sobremesas, a mousse de lima e a panna cotta de chocolate branco com coulis de manga são as mais procuradas, capazes de prolongar o sabor do Verão pelas restantes estações do ano.
À equipa de sete pessoas no Inverno, somam-se outras tantas na época alta, num ambiente familiar que se percebe, desde logo, pelas palavras de Inês, que não poupa elogios ao casal Rita e Carlos, os proprietários. “São pessoas fantásticas, mesmo. Isso faz toda a diferença.” Talvez seja esse o segredo do Xiringuito: a harmonia entre quem serve, quem cozinha e quem vem desfrutar.
Natural de São Simão de Litém, no concelho de Pombal, Inês não esquece as raízes. Volta frequentemente para visitar os pais, a irmã, mais nova, e os amigos, mas é na Figueira da Foz que está a construir o presente com os olhos postos no futuro. “Já estou aqui há cinco anos”, conta.
De São Simão de Litém à Figueira da Foz, Inês António encontrou, lado a lado com o namorado, não só uma profissão, mas um propósito. Representa uma geração que insiste em ficar e em fazer da restauração não um sacrifício, mas uma escolha.