EM LUME BRANDO | Iogurte natural, sem bolacha Maria, se faz favor!

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Ainda existe um certo hábito de oferecer bolacha tipo Maria triturada no iogurte natural aos bebés, seja na creche ou em casa. Com esta prática, não estamos a dar oportunidade ao bebé de aprender a gostar e a apreciar o sabor natural do iogurte, o que poderá levar a que queira sempre iogurtes doces ou a rejeitar alimentos menos doces.
A Diversificação Alimentar (DA) ou alimentação complementar é o processo em que o bebé começa a consumir outros alimentos que não o leite materno ou fórmula artificial para lactentes, até ser capaz de fazer uma alimentação semelhante à dos adultos, o que tende a ocorrer por volta dos 12 meses.
Após completar os 4 meses, o bebé pode iniciar a diversificação alimentar, ou seja, poderão ser oferecidos outros alimentos para além do leite. É nesta idade que o bebé adquire as competências necessárias para esta nova fase da sua vida.
A introdução de novos alimentos deve ser gradual, tranquila e sem pressas para que o bebé se adapte a novas texturas, novos sabores e podermos identificar alguma intolerância/reação alérgica, eventual.
Um dos objetivos da DA passa por dar a conhecer novos sabores ao bebé, o mais próximo possível do original, para que ele possa aprender a gostar dos outros sabores. Não será necessário ensinar a gostar do sabor doce, uma vez que nascemos todos a gostar deste sabor. Daí fazer sentido que não se adicione sal ou açúcar no primeiro ano de vida, para não adulterar o sabor natural dos alimentos, por um lado, e também para não sobrecarregar os rins dos bebés, por outro lado.
De acordo com as indicações de 2012 da Acta Portuguesa de Pediatria, Alimentação e nutrição do lactente, “o iogurte poderá ser introduzido a partir dos 9 meses num lanche, em alternativa ao leite ou papa. Deve ser natural, sem aromas nem quaisquer aditivos de
açúcar (adocicados) ou de natas (cremoso).”
Neste documento ainda podemos ler que “o iogurte é um alimento lácteo fresco obtido pela fermentação do leite por e contém leveduras. Sendo um alimento completo, com proteínas de alto valor biológico, vitaminas e minerais de entre os quais o cálcio, as suas particularidades condicionam uma melhor absorção deste mineral bem como uma ausência dos efeitos adversos característicos do leite em crianças com intolerância à lactose. Com um importante papel pré e próbiotico, é um alimento bem tolerado, protetor de infeções intestinais e regularizador e protetor da flora cólica.” Aconselho também a leitura do artigo escrito pela Dra. Sara Paulino, médica interna de Medicina Geral e Familiar tem uma visão atual e muito interessante da diversificação alimentar, com uma base bem sustentada na evidência científica.
Voltando à bolacha tipo Maria, e sabendo nós que tem açúcar e sal na lista de ingredientes (Ver imagem abaixo), já para não falar das gorduras, porque é que ainda se teima em oferecer este tipo de alimento nas creches?


Atenção, que não quero de modo algum demonizar a bolacha tipo Maria ou qualquer outro tipo de alimento, pois devemos ter uma relação saudável com os alimentos. No entanto, este tipo de alimentos deverá ser evitado ao máximo na diversificação alimentar, pois poderá interferir com a introdução de novos alimentos menos doces, por um lado, e podemos estar a habituar o bebé a um nível de doce que não é necessário.
Também não fará sentido misturar fruta no iogurte natural logo de início, pois estaremos, mais uma vez, a mascarar o sabor natural do iogurte com o doce natural da fruta, e não estamos a dar oportunidade ao bebé de aprender a gostar deste novo sabor, mais amargo.
Devemos, então, treinar o sabor do iogurte natural e só mais tarde (quando o sabor do iogurte natural estiver bem consolidado) poderemos adicionar, de vez em quando, fruta ao iogurte. O ideal será oferecer o iogurte natural e a fruta em separado.
Gostaria de sugerir que deverá fugir da maioria dos alimentos que se dizem indicados para crianças, à exceção das fórmulas infantis/leite adaptado e de algumas papas, pois a maioria contém grandes quantidades de açúcar.
Aproveite a diversificação alimentar para oferecer alimentos saudáveis (legumes, vegetais, fruta, sopa, por exemplo) e criar rotinas saudáveis (evitar o sedentarismo), para que seja este o padrão alimentar a adotar de futuro pela criança que tem à frente e assim aumentar a probabilidade de vir a ser um adulto saudável.
Lembre-se que a necessidade de oferecer doces às crianças é dos adultos. Se as crianças não pedirem doces, porque razão haveremos nós, adultos, de lhes oferecer este tipo de alimentos e criar um hábito diário pouco saudável?

Para sugestões de temas ou comentários ao artigo, envie um email para o seguinte endereço: joanagante@gmail.com

Joana Gante
Nutricionista
CP 3640N
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https://instagram.com/joanagante

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Joana Gante nasceu em Coimbra em 1984. Licenciou-se em Jornalismo pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra em 2008, e em Dietética pela Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria em 2016. Pós-graduou-se em Nutrição em Pediatria pela Universidade Católica de Lisboa em 2018. Tem feito diversas formações, nomeadamente em Nutrição avançada no Desporto; Alimentação Vegetariana; Alimentação na Pessoa Idosa, entre outras. Exerce funções enquanto Nutricionista na Associação Cultural Desportiva e de Solidariedade da Freguesia da Vinha da Rainha e em diversas clínicas.