Há quase 45 anos ‘a virar frangos’, Mário Bicho deixa comando da mítica churrasqueira

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É com “muita mágoa” que Mário Bicho se despede de uma história de “44 anos e quase nove meses” ao comando da Churrasqueira do Cardal, no centro da cidade. A partir do dia 1 de Outubro, o restaurante está entregue a uma nova gerência.
Sem conseguir esconder a emoção, patente nas lágrimas que teimam em cair, Mário Bicho fecha um capítulo de uma boa parte da sua história de vida, que se cruza com a dos tantos clientes que por ali passaram ao longo destes anos. Os mesmos que se haveriam de transformar, também, em grandes amigos, à boleia das conversas junto ao grelhador, onde passava a maior parte do tempo, à mesa das refeições ou, até mesmo, nos jogos de cartas que ali se disputavam nos intervalos entre os almoços e os jantares.

O trabalho no grelhador esteve sempre entregue ao empresário, que não delega em mais ninguém

Questões de saúde obrigam Mário Bicho, de 72 anos, a repousar, mas o empresário garante que irá continuar a dar apoio, nesta fase inicial, aos novos ‘inquilinos’. “O contacto com os clientes é o que me vai deixar mais saudades”, afirma, com a voz embargada, à mesa de uma das salas do restaurante, após o almoço. “Toda a gente me adora”, de tal modo que “tenho fotografias com os clientes espalhadas pelo mundo inteiro”.
Aqui, não se vem à procura de luxo na ou requinte à mesa. Do lado de lá da porta principal, cruza-se todo o tipo de clientes, sempre com um denominador comum: comer bem e em ambiente familiar.
A comida, com o toque caseiro capaz de nos fazer sentir que estamos em casa, é o principal cartão-de-visita, onde há um lugar especial reservado para o frango assado, a ‘estrela do cardápio’. E isso muito por ‘culpa’ de Mário Bicho, o homem que, desde o início, assume o comando do grelhador, instalado mesmo à entrada. É também a ele que cabe a preparação do molho que faz com que muitos apontem aquele como o melhor frango da região. “Só confio em mim para esta tarefa”, assume, garantindo, no entanto, que todos os conhecimentos serão passados aos novos responsáveis pelo restaurante. O sucesso do frango assado é de tal ordem que, no mês de Agosto, chegavam a passar pelo grelhador “12.000 frangos”.
O reconhecimento de clientes é, contudo, fruto de muitas horas de trabalho diário. “Sou o primeiro a entrar, às 05h30, e o último a sair”, conta.
Nos quase 45 anos de vida da Churrasqueira do Cardal, Mário Bicho orgulha-se de o restaurante fazer parte das vivências de tantas gerações. “Antigamente, todos os fins-de-semana servíamos aqui grupos de cento e tal jovens”, recorda, sem esquecer momentos marcantes como a passagem das selecções da Rússia, Ucrânia, França, Espanha, Alemanha ou Inglaterra. “Todos adoraram o frango”, diz, com um sorriso de orgulho. “As russas não nos percebiam, mas tentavam traduzir para dizer que estavam encantadas”, lembra, por entre o muito que haveria para contar.

Os primórdios da casa
Foi uma casa muito degradada aquela que Mário Bicho e a esposa encontraram, há 44 anos. Puseram mãos à obra e, juntos, deram nova vida a um espaço que se tornou, no decurso deste período, uma das referências da restauração local. Desse tempo, Mário Bicho recorda, por exemplo, o balcão de pedra mármore que ali existia ou o “portão todo podre”, à entrada. “Remodelei tudo”, recorda. Feitas as obras, comprou então o grelhador automático que instalou à entrada.
Não tinha experiência na restauração, nem antecedentes familiares, mas valeu-se da experiência na Guiné, onde esteve 28 meses. “Lá, já fazia uns assados para mim e para os amigos”.

 

Mário Bicho com a esposa, que coordena o trabalho na cozinha do restaurante

 

Mário Bicho rodeado de alguns dos clientes que se tornaram amigos