Eleitoralismo, défice orçamental e dívida pública

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Manuel Duarte Domingues | manuel.duarte.domingues@gmail.com

O recém-eleito candidato do PS a primeiro-ministro nas eleições de 2015 prometeu que, iria repor na totalidade, os cortes dos vencimentos da função pública em 2016. Ao ouvir esta promessa eleitoral, veio-me à memória uma história do PREC que se pode resumir assim: num comício de um partido da extrema-esquerda, no pós 25 de Abril, o orador afirmava que se o seu partido ganhasse as eleições só se trabalhava 1 mês no ano. Estavam dois amigos a assistir, mas um era mais distraído e não ouviu esta promessa eleitoral. Mas, ouvindo os fortes aplausos, perguntou ao amigo o que é que o orador tinha dito. A resposta “se ganharem as eleições só se trabalha 1 mês no ano” obrigou-o a pensar durante alguns minutos, concluindo logo a seguir: “É pá, isso não está mal visto… mas então… e as férias?

Teremos que elogiar a frontalidade do atual primeiro-ministro quando, recentemente, teve a coragem de afirmar que a carga fiscal suportada pelos contribuintes portugueses vai aumentar em 2015. Porque haverá eleições legislativas em 2015 e a nossa experiência passada diz-nos que, antes das eleições, sempre foram feitas promessas que os políticos sabiam antecipadamente que não podiam cumprir e eram escondidas as verdades inconvenientes.
Todos se lembrarão da penúltima campanha eleitoral, em 2009. Sócrates ganhou, sem maioria absoluta, do seguinte modo: para além das promessas eleitorais habituais, aumentou os ordenados dos funcionários públicos 2,9% e reduziu a taxa normal do IVA em 1%, sabendo perfeitamente que estas medidas eram um atentado contra as finanças públicas. Acresce que a crise financeira internacional tinha começado em 2008 e uma governação prudente e patriótica nunca teria tomado medidas como as referidas, só para ganhar as eleições.
O efeito foi catastrófico para o País, dado que o défice orçamental em 2009, foi de 9,8% do PIB (em 2010 de 11,2%, em 2011 de 7,4%, em 2012 de 5,5%, em 2013 de 4,9%, em 2014 prevê-se 3% e em 2015 será de 2,7%) e a dívida pública aumentou em 2009 no montante de 14.284 milhões de euros e continuou a aumentar nos anos seguintes (2009 foi o valor mais elevado até então; em 2005, já com Sócrates foi de 11.018 milhões; nos anos anteriores o aumento foi sempre mais baixo, sendo de 7.362 em 2004 com Santana Lopes e Bagão Félix e de 7.024 em 2002 com Durão Barroso e Manuela Ferreira Leite). Em resultado, passado cerca de ano e meio, Sócrates chamou a troika, pediu assistência financeira, porque já não havia dinheiro para satisfazer os compromissos do Estado, especialmente os relativos a ordenados.
Depois dos cortes na despesa pública a que fomos obrigados pela troika (em milhões de euros: 2012 = 9.041; 2013 = 5.338; 2014 = 3.558 e 2015 = 1.249), parece que estamos a adequar o valor da despesa pública ao da receita, reduzindo assim o défice orçamental. Este ajustamento tem que ser consolidado nos próximos anos, sob pena de voltarmos a 2011 e a uma nova intervenção da troika.
Ora o que nos deixa preocupados, são as afirmações dos novos líderes do PS, prometendo repor os ordenados, acabando com os cortes e outras promessas, mas não dizendo onde vão buscar o dinheiro para fazer face ao aumento da despesa. Parece mesmo que o objetivo é conquistar o poder a qualquer preço. Só que a realidade portuguesa não mudou nem se perspetiva um aumento das receitas públicas que permitam um aumento de despesa sem recorrer ao endividamento do Estado.
Relativamente a 2015, valerá a pena analisar alguns valores do Orçamento de Estado para termos uma ideia correta da realidade. Os juros da dívida (7.926 milhões de euros) ultrapassarão os valores orçamentados quer para o Serviço Nacional de Saúde (7.874 milhões), quer para a Educação e Ciência (7.723 milhões). Ou seja o Estado vai gastar mais dinheiro com os juros da dívida pública, do que com as despesas com a saúde e com a educação dos Portugueses.
Atente-se agora nos valores estimados para os impostos que o Estado espera cobrar em 2015: IVA (14.491 milhões de euros); IRS (13.168) e IRC (4.690). Em termos globais, a receita prevista é de 54.468 milhões e a despesa de 63.045 milhões, resultando ainda assim uma diferença negativa de 8.577 milhões.
Será fácil concluir que não há folga que permita o aumento de despesa, pelo que todas as promessas neste sentido terão que ser consideradas eleitoralistas e demagógicas.
A carga fiscal que suportamos atualmente é demasiado elevada, prejudicando a economia, porque se pagássemos menos impostos teríamos dinheiro para aumentar o consumo, o investimento, o aforro, etc. Para que a economia funcione melhor e cresça, o Estado terá que emagrecer, poupar, reduzir os gastos. Talvez reduzindo as rendas das SCUTS, das PPP’s e noutras áreas, racionalizando os gastos. A redução dos ordenados e pensões terá que vir em último lugar, por razões óbvias.
O problema é que o atual líder da oposição não diz como vai resolver o problema orçamental do País que, para amortizar a dívida pública, terá que começar a ter superavits orçamentais em vez dos défices que se têm verificado. Querer que sejam os outros países europeus a pagar os nossos erros seria bom mas é utopia.
Na realidade, em 2015 e em termos globais, iremos pagar mais impostos, (nos combustíveis, por exemplo), embora se tenha tido em conta aspetos sociais importantes, como é o caso da aplicação do coeficiente familiar no IRS. São assim tomadas medidas de proteção à família e à natalidade, que terão que ser aprofundadas nos próximos anos, para inverter a tendência de definhamento do País que se tem verificado nos últimos anos. Porque é o futuro do País e das próximas gerações que está em causa.

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