Veterinarices 20/3

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Inverno no seu melhor. Bem a meu gosto, um daqueles dias lindos e soalheiros embora muito frios logo a seguir a umas chuvadas de assustar hortas. Uma vaca estava deitada sem se conseguir levantar num terreno meio prado meio olival. Nessa época tinha um jipe que me dava meios de trabalhar e também me levava em lazer para quase todos os destinos que me apetecesse. Lá chegado, a vaca estava ao fundo do terreno, longe do acesso. Deu-me o comodismo e entrei com a viatura pelo terreno adentro para não ter de carregar com os tarecos. O animal fedia a podridão ainda à distância. Feto morto em trabalho de parto complicado terá sido deslocada para ali para a enterrarem caso morresse. Num laivo de esperança lá chamaram o vet a ver se algo se poderia fazer. Fetotomia, medicamentos e muita piedade pelo sofrimento da bicha, passaram-se umas duas horas e já anoitecia. O terreno onde o carro ficara era um charco das chuvas do dia anterior e ao dar por isso tinha as rodas enterradas em lama. Tão cansado da tarefa nem liguei aos donos do bicho que me azucrinavam: “-não devia ter vindo para aqui de carro – isto são terras moles, nem o tractor as lavra – agora só sai de empurrão – lá na vila é que há alcatrão” Chatos! Liguei o carro, enfiei a tracção às quatro e as redutoras, sempre surdo aos augúrios de mais trabalhos, desembraio suavemente, bem devagarinho… e o Possante (alcunha que lhe dava como se só coisa não fosse) foi saindo, escorregando e dançando ao ronronar da manada a diesel. E levou-me, já sorridente, a terra mais firme. Olho pra trás a despedir-me das gentes e até me deu vontade de rir de contente: A vaca levantara-se e, embora cambaleante, deu em petiscar umas folhas das oliveiras!

Há dias que correm mesmo bem!

Bem hajam, até breve.

Carlos Tomaz

Médico Veterinário