N(A) ESCOLA DA VIDA | Gaiteiros: uma tradição aliada ao conhecimento

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Recordo o Bodo de há alguns anos. Na altura ainda residia num rés-do-chão numa das artérias de Pombal, onde era habitual os gaiteiros passarem. Costumava brincar na rua. Desenhava os quadrados da macaca com um caco no alcatrão jovem. Assim que ouvia o som da gaita-de-foles ficava (mais) desperta. Sabia que, com eles, vinham sempre os gigantones e os cabeçudos. Era destes que fugia, recolhendo-me em casa, nesse porto seguro. Apenas voltava para a rua quando o som abafava. Mas não sem antes me certificar dessa distância de segurança, através do vidro das janelas envelhecidas.
Recordar esta tradição é, ainda hoje, ver a cor, a vida e o regozijo dos gaiteiros. Mesmo que acabasse por não saborear o momento, debaixo dos meus tenros anos de infância.
No dia 30 de março de 2018, no âmbito das comemorações do Dia Nacional dos Centros Históricos, aconteceu “magia” em Pombal. A Junta de Freguesia de Pombal promoveu o I Encontro de Gaiteiros e a chuva não impediu vários grupos de percorrer as artérias da cidade em perfeita comunhão com o carisma e o sentido de humor peculiar ao qual é praticamente impossível ficar-se indiferente.
O convívio, a valorização de uma das formas musicais mais antigas e pitorescas e o (re)conhecimento desta arte andaram de mãos dadas. Olhares curiosos espreitaram de janelas e debruçaram-se às varandas. Aqueles que carregam o peso dos anos transformado em experiência de vida dançaram e fizeram dançar. Sorriram em cada passo espontâneo e improvisado, transparecendo nostalgia. Como se, por momentos, alguém lhes resgatasse os sorrisos que os dias taciturnos (de um inverno que insiste em prolongar-se) lhes imprimem nos semblantes.
Homens e mulheres trouxeram nos ombros conjuntos instrumentais que expiram os sons de sempre, mas inspiram as gentes dos dias de hoje com o elixir de uma cultura que (também) é nosso sangue e identidade. O brio e o orgulho que envergavam difundiu-se, durante o dia, por osmose, contaminando todos aqueles com quem se cruzavam nas esquinas, nas lojas, nos cafés e nas ruas.
A tarde teve um pulsar diferente. Foi palco de sensibilização da população face a esta arte e tradição, trazendo, na voz de quem ama o que faz e faz o que ama, a emotividade e a sabedoria gentilmente partilhadas.
Sim, tudo isto é Cultura. Tudo isto valoriza as histórias e os encantos das nossas gentes, das nossas raízes e dos nossos saberes. E, por isso, (também) é Educação.

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Embora os documentos legais a identifiquem como natural de Pombal, foi em Coimbra que respirou autonomamente pela primeira vez. Assim, desde o penúltimo dia de dezembro de 1982 assumiu um compromisso com a vida: aprender a ser. Quase duas décadas depois regressou à cidade do Fado e do Mondego para dar continuidade à sua formação académica na área de Ciências da Educação. Aprofundaria aqui o significado de outro pilar: aprender a conhecer. Começou a aprender a fazer em 2007, quando a socialização profissional lhe abriu as portas no ramo da Educação e Formação de Adultos, no qual tem trabalhado e realizado investigação. Gosta de “sair por aí” e observar e fotografar todas as esquinas. Reserva ainda tempo para a escrita, sentindo-a como um elixir lhe permite (re)descobrir uma energia anímica e uma força motriz nos cantos mais inóspitos aos quais muitos olhares não associariam qualquer pulsar. É, neste campo, autora de obras literárias individuais e de vários textos e poemas publicados em coletâneas. E é assim que lê, sente e inala o mundo, num permanente aprender a viver com os outros.